Biografias

Para o cineasta Sylvio Back, Curitiba é uma cidade muito madrasta

Quando gravou uma entrevista para a série de livros “Memória Paranense”, em março de 1998, Sylvio Back tinha uma obra cinematográfica de 36 filmes, dez deles longa-metragens.  E tinha publicado vinte livros – entre poesias, ensaios e os argumentos e roteiros de vários de seus filmes. Leia um trecho da conversa sobre Curitiba e o Paraná

 

José Wille – Qual é sua análise sobre a cultura paranaense, que é considerada deficiente e valoriza mais o  que vem de fora?
Sylvio Back – Curitiba, e eu falo de cátedra, é muito reverente com os estrangeiros, com as pessoas que vêm de fora. Quando eu sou criticado em Curitiba, eu sou cineasta catarinense; quando sou elogiado, sou cineasta paranaense. Mas eu acho que a autofagia de Curitiba, que se coloca como pilar do pensamento do imaginário curitibano, é uma coisa universal. O que eu acho que é muito característico é a madrastice de Curitiba. É uma cidade muito madrasta com seus políticos, com seus artistas, com seus criadores. Curitiba não suporta o sucesso das pessoas. É uma coisa muito peculiar da cidade. Você vai a outros estados – em Santa Catarina, no Rio Grande do Sul, na Bahia, no Rio, em São Paulo – e ali há um enaltecimento pelos filhos, pelos criadores da terra, sejam eles políticos, sejam cientistas, poetas, cineastas, escritores, atores… Ali se elevam as pessoas que criam e, em Curitiba, que tem grandes poetas, grandes escritores, a cidade brasileira que tem mais jovens cineastas e curta-metragistas premiados, isso tudo não é levado em conta. Mas, quando vem alguém de fora, qualquer coisa que venha de fora de Curitiba, a cidade se curva reverente. Curitiba não tem autoestima! Procura-se fazer da autoestima quase como que um marketing da cidade, mas a cidade não sente essa autoestima.
 – Você está há 12 anos morando no Rio de Janeiro, mas, depois de tanto tempo vivendo em Curitiba, praticamente sua vida foi aqui em nossa cidade. Você ainda se sente curitibano quando retorna, ou já se perde um pouco, não encontra mais os conhecidos?
Sylvio Back – Não, a gente encontra todo mundo. Jamais você deixa de ser curitibano. Meus filhos são curitibanos, gerados no Rio de Janeiro, mas nasceram aqui. Minha mulher é curitibana, a Margrit, minha companheira de trabalho… Eu gosto de Curitiba, aqui é uma cidade que todo mundo sabe da qualidade de vida. Mas Curitiba tem seu lado perverso, que muitas vezes desmobiliza esse lado positivo da cidade. É como se fosse um câncer corroendo essa coisa bela da qualidade de vida – quer dizer, o imaginário da cidade não corresponde muitas vezes ao seu perfil físico urbanístico. E o Rio de Janeiro é uma cidade em que eu sempre tive esse sonho de morar, desde os anos 50. Quando me formei em Paranaguá, em vez de gastar dinheiro com terno, com quadro, com baile, eu fui para o Rio de Janeiro. E daí você percebe como o imaginário do cinema é forte. Hoje, você chega numa cidade europeia ou americana e é como se você já estivesse estado lá, porque o cinema introduziu esse imaginário. Quando eu cheguei ao Rio de Janeiro, na avenida Rio Branco, em Copacabana, nos anos 50, de tanto ver as chanchadas cariocas, senti-me em casa. Daí a importância do audiovisual – esta importância que me ocorreu e eu coloquei pela primeira vez no cinema. Muitas críticas de cinema dos anos 60 feitas ao ”Lance Maior” surgiram da estranheza. As pessoas viram Curitiba – pois nunca a tinham visto – e pensavam “Que cidade é essa?”. Quer dizer, isso foi colocado pela primeira vez em termos de ficção no cinema.

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Trecho do primeiro filme de Sylvio Back, Lance Maior, em Curitiba, no ano de 1968.

 

 

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